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Como enfrentar o medo da solidão?

Por Évelim Wroblewski

Lá se vão 27 anos desde que a primeira rede social no formato que conhecemos foi lançada. A grande promessa: conexão sem limites. Poderíamos conversar com qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo. E assim, não estaríamos mais sozinhos.

Mas a verdade é que a realidade tem sido muito diferente do que esperávamos. Segundo uma pesquisa da Gallup, aproximadamente 77% das pessoas adultas no mundo se sente solitária.

No Brasil, 50% da população afirma se sentir dessa maneira, de acordo com a Ipsos. Esse dado coloca o nosso país em primeiro lugar do mundo no ranking de solitários.

Logo uma nação que é conhecida mundialmente pela alegria, receptividade, amorosidade e calor humano. Parece contraditório, não é mesmo?

Mas você já parou para pensar sobre por que temos medo da solidão? E como enfrentar essa realidade cada vez mais presente na vida de todas nós? É sobre isso que eu quero conversar contigo hoje.

O que é solidão, afinal?

A solidão pode ser definida por um sentimento de isolamento e desconexão social, caracterizado pela ausência de vínculos emocionais.

Essa ausência de conexão com outras pessoas leva a sentimentos como tristeza, abandono, falta de pertencimento, inadequação, entre outros.

Quando nos sentimos sós, tendemos a ter pensamentos negativos, perder a esperança na vida, remoer ressentimentos e nos desconectar das pessoas ao nosso redor.

Tudo parece sem sentido. E assim mergulhamos em uma espiral de pensamentos que acabam nos levando ao adoecimento.

Esse tema se tornou tão importante que a Organização Mundial de Saúde — OMS criou uma comissão específica para lidar com a solidão, chamada de Comissão de Conexão Social.

Essa movimentação se deu a partir da constatação de que a solidão tem impactos profundos na saúde.

Qual a diferença entre solidão e solitude?

Antes de pensarmos em como enfrentar o medo da solidão, é importante compreendermos a diferença entre solidão e solitude.

Enquanto a solidão é definida por um conjunto de sentimentos negativos, que são resultado da falta de conexão social, a solitude pode ser entendida como o prazer de se estar sozinha. Em outras palavras, a solitude é uma escolha. A solidão, não.

Estar em solitude significa sentir-se bem em ter momentos a sós consigo mesma, desfrutando desse tempo para realizar atividades que te dão prazer. Solidão, por sua vez, é querer se conectar a outras pessoas e não conseguir construir esses vínculos, seja pelo motivo que for.

Agora que você já sabe a diferença entre solitude e solidão, podemos dar um passo adiante e entender como a solidão impacta em nossas vidas.

Como a solidão afeta a nossa saúde?

Segundo o relatório Nossa epidemia de solidão e isolamento, publicado em 2023, a falta de conexão social e o isolamento podem aumentar o risco de morte prematura em 26% e 29%, respectivamente. Esses índices correspondem ao mesmo que fumar 15 cigarros por dia ao longo da vida.

O mesmo documento mostra que a solidão pode acarretar em aumento do risco de doenças cardíacas (29%) e acidente vascular cerebral (32%). Outras doenças associadas ao isolamento social são a ansiedade, a depressão e a demência.

Embora essas doenças pareçam ser mais comuns em pessoas mais velhas, estudos apontam que até 20% das crianças e 14% dos adolescentes se sentem solitários.

Em decorrência do sentimento de solidão, também podem surgir distúrbios alimentares, dependência de substâncias como álcool ou drogas e outros tipos de vícios, como pornografia ou jogos, por exemplo.

Como você pode ver, os impactos da solidão na saúde não são poucos. Por isso, mais do que nunca, precisamos promover meios de enfrentar o medo da solidão e proporcionar novas formas de conexão.

Medo da solidão: como encarar esse desafio?

O medo da solidão pode chegar a qualquer momento das nossas vidas. A perda de um ente querido ou o término de um relacionamento, por exemplo, costumam vir acompanhados desse sentimento.

A mudança de cidade ou país, o fim da faculdade e do contato diário com os amigos, a dificuldade de se integrar em uma nova escola, a mudança de emprego, tudo isso pode gerar o medo da solidão.

Mas esse sentimento não precisa tomar conta da sua vida. Existem formas de lidar com isso. E vou listar algumas delas aqui para você:

Abrace a sua solidão

Vivemos em um mundo de aparências. As redes sociais nos mostram fotos de viagens incríveis, baladas disputadas, pessoas ricas e bem-sucedidas, fórmulas mágicas para o sucesso e o corpo dos sonhos.

Mas isso não passa de um micromomento na vida real dessas pessoas. Isso quando essas imagens não são completamente forjadas em estúdios e softwares de edição gráfica.

Sentir-se só faz parte da natureza humana. E para enfrentarmos o medo da solidão, precisamos reconhecê-lo quando ele se apresenta e convidá-lo para uma conversa.

Essa conversa, é claro, é com você mesma. Por que você se sente só? Existe algo que você possa fazer para transformar esse sentimento?

Abraçar a solidão é olhar para dentro de si e encontrar o caminho de volta à sua essência. Aquele caminho que te traz felicidade, harmonia, paz interior e desejo pela vida.

Caso perceba que não consegue fazer isso sozinha, sempre há a possibilidade de pedir ajuda profissional de um psicólogo ou psicóloga.

Expresse seus sentimentos

Uma das formas mais potentes de digerir nossas emoções, assimilá-las e transformá-las é através da arte. Nesse sentido, procure expressar seus sentimentos de forma lúdica e descompromissada.

Pegue uma folha de papel em branco e desenhe o seu medo da solidão. Como ele se parece? Que características ele tem? Quais outros sentimentos ele desperta em você? Raiva, tristeza, cansaço?

Você também pode pintar quadros, escrever em um diário, entalhar madeira, bordar uma peça de ponto-cruz. Só coloque para fora o que você está sentindo.

Quando me sinto só, eu escrevo poesias. Escrevo para aquelas pessoas que não estão mais aqui, para aquelas que me magoaram de alguma forma, para o sentimento de vazio ou para a raiva que insiste em aparecer. Experimente fazer isso também.

Desenvolva uma rotina de autocuidado

Eu sei que às vezes a solidão pode nos levar a um extremo em que deixamos de querer trocar de roupa pela manhã, pentear o cabelo, sair de casa, conversar com outras pessoas…

Mas uma das maneiras mais incríveis de enfrentar o medo da solidão é mudando a nossa rotina. Isso porque quanto mais nos isolamos do mundo, menos chances temos de conhecer pessoas e criar novos vínculos, novos relacionamentos.

E o primeiro passo para essa mudança de rotina começa com você. Desenvolva o costume de colocar uma roupa bonita, mesmo que vá ficar em casa.

Arrume seu cabelo de uma forma diferente, use um brinco que você gosta, dedique algum tempo a massagear o seu corpo com um bom creme hidratante. Esses pequenos mimos têm o poder de despertar a sua autoestima, a sua vitalidade e o seu desejo por novas conexões.

Viaje sozinha

Acredito que uma das formas mais poderosas de se libertar do medo da solidão é viajar sozinha.

Primeiro, vem o medo de estar sozinha em um lugar desconhecido, sem ninguém para te salvar de qualquer enrascada. Depois, vem aquela sensação de frio na barriga pelas inúmeras possibilidades de você estar em um lugar completamente novo.

No dia da viagem, você quase desiste. Afinal, onde você estava com a cabeça? Mas quando você entra no ônibus ou no avião, dá uma total sensação de liberdade.

Além disso, estar em um lugar desconhecido te força a falar com pessoas que você não conhece. Te faz sentar no barzinho sozinha, pedir informações e se integrar com outras pessoas para poder aproveitar melhor passeios e outros programas.

Viajar sozinha abre espaço para novas amizades e experiências, o que pode te fazer esquecer do medo da solidão.

Faça parte de uma comunidade

Dentro da cosmovisão andina, cada pessoa que faz parte de uma comunidade é responsabilidade de todos. Nesse sentido, quando alguém está doente ou sente solidão, é papel de toda a comunidade cuidar dessa pessoa.

Esse sentido de união é chamado de Ayllu e é permeado por outros valores que conformam a tradição andina, como o trabalho comunitário, o respeito às diferenças e a reciprocidade. Portanto, estar em comunidade é estar com-unidade. Ou seja, todas as pessoas estão unidas por um propósito em comum.

As diferenças, sejam de idade, raça, credo, talentos, habilidades, conhecimentos, são respeitadas e utilizadas em prol do todo. E assim, cada pessoa é valorizada pela sua individualidade, afinal, o todo, a unidade, não seria o mesmo sem aquela pessoa.

Quando você se sente amparada por uma comunidade, fica mais fácil enfrentar o medo da solidão. Afinal, você não precisa fazer isso sozinha.

Espero que este artigo tenha te ajudado a perceber o medo da solidão não como um fator adoecedor da sua vida, mas como um ponto de partida para transformar esse medo em potência.

Obrigada por me ler até aqui e a gente se vê no próximo artigo!

Évelim.

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